segunda-feira, 11 de abril de 2011

Só pressão social pode equilibrar preço do álcool

ENTREVISTA CÍCERO JUNQUEIRA FRANCO 
USINEIRO E EX-COORDENADOR DO PROÁLCOOL DIZ QUE MEDIDAS DO GOVERNO PARA CONTER ALTA DO ETANOL NÃO VÃO DAR RESULTADO

ARARIPE CASTILHO
DE RIBEIRÃO PRETO

O etanol ainda está caro nos postos -apesar da recente queda, depois de 18 semanas em alta- e as desculpas para o aumento são sempre a falta do produto nas usinas e maior viabilidade econômica do açúcar. Há ainda a frota flex crescente.
A solução para o ciclo que torna o consumidor refém do sobe e desce de preço exige "pressão social" contra o governo, avalia Cícero Junqueira Franco, 79, usineiro e um dos ex-coordenadores do Proálcool nos anos 1970.
Para Franco, o Brasil precisa de uma política energética. Ele afirma que as investidas do governo Dilma Rousseff sobre o setor, reveladas na semana passada pela Folha, não vão dar resultado.

Crítico da gestão do ex-presidente Lula, Franco diz que o PT "está entregando o setor sucroalcooleiro para multinacionais". Uma das usinas comandadas por ele, a Vale do Rosário, se uniu à multinacional Louis Dreyfus. Leia a seguir os principais trechos da entrevista, concedida em Orlândia, interior do Estado de São Paulo.

Folha - Por que o senhor acha que os planos de restringir financiamento de bancos oficiais para produção de açúcar não vão funcionar?
Cícero Junqueira Franco -
Essa é uma medida de quem não conhece o funcionamento do setor e, na verdade, só está tentando apagar o fogo do momento. Vão reduzir um financiamento que praticamente é inexistente, são pouquíssimos casos.
Além disso, a produção de açúcar e de álcool usa a mesma matéria-prima e tecnologias na maior parte do processo industrial. Quem produz um produz o outro sem grandes dificuldades.
Quando, de fato, o senhor acha que o consumidor deixará de ser surpreendido pelas altas no preço do etanol?A volatilidade de preço é resultado da falta de uma política para estabelecer um estoque regulador. Isso tem de beneficiar a sociedade como um todo. O consumidor é também responsável e tem de entender isso.
Há diversas formas de pressionar o governo a criar uma política para dar equilíbrio permanente ao preço do álcool. Essa pressão pode ser feita através dos deputados, associações de classe e sociedade organizada como um todo. Não existe um movimento organizado nesse sentido, há só vozes dispersas.
O fato é que tem de haver uma mobilização, uma pressão social por um marco regulatório. E não basta só criar, será preciso monitorar essa política. Essa ação da sociedade vai criar uma reação.
A "reação" será etanol a preço baixo nas bombas?Não necessariamente baixo. O preço baixo pode beneficiar o consumidor, mas também prejudicá-lo. Se isso acontecer [preço baixo], não terá produção e, sem ela, vai faltar produto. O resultado será um prejuízo para o consumidor. Preço baixo não pode ser obsessão, temos de buscar o preço razoável.
Qual seria o preço razoável?Isso só será estabelecido pela relação com o custo da produção. O custo tem de ser equilibrado também. Hoje há um clamor muito grande sobre o custo Brasil, que envolve os fatores que reduzem a competitividade nacional, como impostos e transportes.
Temos de criar uma estrutura para baixar o custo e, consequentemente o preço, sem prejudicar o produtor.

Como o Estado vai poder interferir imediatamente?Política fiscal é uma possibilidade, mas desde que seja bem dosada e utilizada na hora certa. E não pode ser uma solução definitiva. Só que também não se aumenta a produção [de álcool], agora, de uma hora para outra. Para construir uma usina e formar um canavial, demora cinco ou seis anos.
E qual é a solução? Intervenção permanente do Estado?Não, o que falta é uma política estável e segura para o setor. O setor sucroalcooleiro sempre foi a menina dos olhos do PT. Antes de ser governo, era o partido que mais defendia o setor. Depois que assumiu, a política é outra. O PT está entregando o setor sucroalcooleiro para multinacionais. No começo do governo Lula, havia de 4% a 5% de multinacionais no setor. Hoje são mais de 35%.
Por que as empresas estrangeiras vão influenciar no preço do álcool na bomba?A multinacional está interessada no mercado lá fora e não no abastecimento interno. A empresa estrangeira quer ganhar dinheiro lá fora, com açúcar ou álcool.
E o que vai impedir o empresário brasileiro de vender para o exterior quando o preço for conveniente?É por isso que precisamos de um marco regulatório, que o governo tem de estabelecer para não prejudicar o consumidor nacional.

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